descansar a cabeça na terra

Descansar a cabeça na terra.

 

Esse gesto que tem me acompanhado há tanto tempo, se faz ainda mais necessário nesses tempos de quarentena.

Com a cabeça descansada na terra, sinto sua respiração, seu cheiro, seu calor, sue núcleo cósmico quente.

E junto sinto também minha respiração, meu pulsar, meu calor, meus cheiros, meu núcleo cósmico quente. 

Sinto onucleo cósmico quente.

Sinto o sol aquecer a pele e viro semente.

Aninho-me em meu centro.

Descanso do peso dos dias.

Com a cabeça e o ventre colados ao chão, danço com as palavras, me sentindo tocando sem suas peles, sentindo a vibração desse chão partilhado.

 

Por que chamar essas mulheres para sonhar o chão?

 

Patrícia com seus sonhares, dança de cura do útero, dançares que abrem visões.

Aline com suas palavras que brotam da terra, que acendem memória da terra e traz a cura da Serra que Chora.

Andreza com seus gestos-gritos que alargam horizontes e trazem a potência que vez da ferida do asfalto.

 

Minha carne treme.

O coração salta.

A pele se espraia, imaginando um contato.

Temos o chão como superfície comum para nossa dança.

Colo da terra.

Temos o céu como horizonte.

Sonhar o chão tem o cheiro de encontro.

Tem cheiro de abraço dado no espaço.

Abraçar cada uma dessas mulheres que nos inspiram a estar junto, inventar modos de ativar presenças, criar novas telepatias, sonhar, imaginar um mundo sonhado junto.

Instaurar uma dança que se levante.

Dança que mova mundos,

Que teça teias afetivas frente à passividade e anestesiamento que teimam  a permear nossos dias.

Ouço cantar de pássaros e o martelar dos trabalhadores, o som dos carros, vozes de criança que passam na rua.

 

A cidade vive...

A cidade vai precisar ser sonhada, cuidada, lavada, restaurada.

 

A terra chora.

A cidade clama.

Nossos corpos pulsam um desejo comum de projetar possíveis no espaço.

 

Descanso o corpo no chão.

Sua pele me dá contorno.

O chão é aqui e agora o colo da Terra que me sustenta, me faz voltar ao útero, à floresta primeira, espaço primordial, faz plantar sementes no chão.

Retirar camadas de asfalto, restaurar a pele da terra.

Retornar à terra. Retomar.

Fazer brotar flor do asfalto no corpo da cidade. (Marielle vive!!!)

 

Adormeço.

Vem-me um sono bom.

Adormecer para conhecer.

Adormecer para encontrar.

Sonhar para imaginar um mundo por vir.
Dançar um sonho junto no mesmo chão colo do mundo.

Dançar para adiar o fim.  

 

(cartografia de uma dança-escrita intergaláctica no dia 03/08/2020)


Comentários

Postagens mais visitadas